Ana Lúcia Cerávolo
O conceito de patrimônio cultural vem sendo alargado desde o século XIX, quando as primeiras formulações teóricas foram realizadas na Europa pós-revolução francesa e pós-revolução industrial. O afã de preservação naquele momento era resposta à grande renovação urbana que se observava em Londres e à tentativa de manter a identidade da população com a cidade. Na França, diferentemente, a pilhagem dos bens pertencentes ao clero e à nobreza, fizeram nascer a consciência de uma identidade nacional apoiada em bens culturais.
A restauração, estruturada no século XIX a partir do paradoxo reintegração estilística (Viollet-le-Duc) x conservação (Ruskin/Morris), é uma disciplina que reflete o pensamento cultural do presente. Seu desafio desde as elaborações teóricas de Camilo Boito é a (re)inserção de obras do passado, respeitando sua artisticidade e historicidade; originalidade e autenticidade. A perda dessas características a desqualifica como patrimônio.
Após a II Guerra Mundial, foi formulada na Itália, inicialmente por Roberto Pane, a teoria da restauração crítica, que se opunha à teoria da restauração científica de Gustavo Giovannoni, e expunha com clareza questões que vinham sendo discutidas desde os anos 1930, entre os jovens arquitetos italianos, em relação às novas intervenções e à convivência de materiais novos e antigos. O respeito à obra e aos materiais existentes; a interpretação da obra a partir de sua “unidade potencial”; e a marca contemporânea das novas intervenções são suas principais características.
Ideias caras a Lina Bo Bardi, que introduziu a restauração crítica no Brasil, ainda na década de 1960, durante as obras no Solar do Unhão e provocou o redirecionamento das intervenções até então realizadas pelo IPHAN. Essas ideias devem ser consideradas nas intervenções propostas para adequação do uso do imóvel, para que ele cumpra sua nova função –de sede do Instituto- mas que a unidade potencial da Casa seja mantida e preservada.
Assim, hipóteses e suposições devem ser rechaçadas. Acréscimos ou complementos necessários, por razões estéticas ou técnicas, deverão se distinguir do existente, deixando clara a sua contemporaneidade. Ou seja, elementos destinados a substituir as partes inexistentes de uma edificação devem integrar-se ao conjunto, diferenciando-se das partes originais, a fim de que a restauração não falseie o significado artístico ou histórico do documento.