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implantação da primeira ecovila do país em barão geraldo, a partir de pesquisa de doutorado ‘diretrizes para o desenvolvimento de ecovilas urbanas’ de flávio januário do iau usp

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Barão tem primeira ecovila urbana do País

Já reconhecido internacionalmente, projeto está em fase final de aprovação na Prefeitura de Campinas

A primeira ecovila em área urbana do Brasil está em fase de implantação no distrito de Barão Geraldo, em Campinas. A partir da pesquisa de doutorado, em andamento no Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP (Universidade de São Paulo), intitulada “Diretrizes para o Desenvolvimento de Ecovilas Urbanas”, do arquiteto e urbanista Flávio Januário, orientado pela professora Anja Pratschke, o projeto da chamada Ecovila Santa Margarida, que reunirá 51 famílias no limite de uma área já urbanizada em Barão Geraldo, está na etapa final de aprovação pela Prefeitura de Campinas.

Segundo o autor do projeto, que tem a Santa Margarida como parte experimental de sua pesquisa, a ecovila urbana é um “loteamento de caráter ecológico e baseado nos princípios da sustentabilidade com equilíbrio econômico, ambiental e social” (leia texto abaixo).

“Os conceitos aplicados na elaboração do projeto da Ecovila Santa Margarida, tanto para os sistemas de infraestrutura quanto para as edificações e ações comunitárias, levam em consideração as características de sua própria bio região e também os conceitos internacionais para a caracterização de ecovilas”, diz.

Estes conceitos foram discutidos, em julho deste ano, pela GEN (sigla em inglês para a Rede Global de Ecovilas), na Suíça, na qual estiveram presentes representantes de ecovilas de 51 países, incluindo a Ecovila Urbana Santa Margarida, que representou o Brasil juntamente com a Ecovila Rural Arca Verde, do Rio Grande do Sul.

A GEN, consultora da ONU para assentamentos sustentáveis, reconhece as ecovilas como uma das 100 melhores práticas para o desenvolvimento sustentável do planeta. Depois da apresentação do projeto da Ecovila Urbana Santa Margarida na Conferência, a presidência da GEN e o Casa (Conselho de Assentamentos Sustentáveis das Américas), braço da GEN no continente, nomeou o Instituto Flor do Anhumas – organização gestora do projeto de Barão Geraldo – para atuar como extensão destas organizações na RMC (Região Metropolitana de Campinas). “O objetivo é ampliar a rede de ecovilas e difundir as informações e práticas sustentáveis”, informa Januário.

APROVAÇÃO

O projeto da ecovila está em fase final de aprovação no DU (Departamento de Urbanismo) da Prefeitura de Campinas e deverá iniciar as obras, em junho ou julho de 2014, período sem chuvas na região, com a implantação da infraestrutura em uma área de 87 mil metros quadrados, próximo às margens do Ribeirão Anhumas, respeitando a faixa de 50 metros de APP (Área de Proteção Permanente) definida pelo município.

“No Brasil ainda não existe uma ecovila urbana implantada com diretrizes suficientes para a caracterização de uma ecovila de fato. O que existem são bairros verdes, com algumas casas e famílias seguindo conceitos sustentáveis ou unidades residenciais em áreas urbanas que também seguem estes conceitos. A Santa Margarida, se o município colaborar analisando adequadamente os projetos dentro dos prazos, provavelmente será a primeira ecovila urbana do Brasil”, afirma Januário.

As ecovilas urbanas, diferentemente das ecovilas rurais que vêm sendo implantadas em várias regiões do País, devem seguir modelos de sustentabilidade com atenção nos problemas enfrentados hoje pelas cidades brasileiras – que vão desde a permeabilidade do solo e escoamento da água da chuva para combater enchentes, até a mobilidade urbana, as construções sustentáveis e o tratamento de lixo e dejetos domésticos (leia texto abaixo).

“No caso de Campinas, os sistemas integrados propostos para a ecovila urbana Santa Margarida, não ferem a legislação vigente, mas são complementares a esta, tornando a utilização do espaço urbano muito mais eficiente, com qualidade e baixo custo”.

51 FAMÍLIAS

O músico e agente cultural Cabeto Rocker Pascolato, o primeiro morador a se instalar, com sua esposa e filha, em uma edificação já existente e preservada na ecovila de Barão Geraldo foi um dos responsáveis pela formação do grupo que viabilizou a compra da área para a implantação do projeto (leia texto abaixo).

Cabeto conta que todo o grupo tem interesse nas áreas de sustentabilidade e vida comunitária. “Isso foi fundamental para a viabilização do projeto, uma vez que o nosso empreendimento tem normas que devem ser seguidas permanentemente pelos moradores, pois o conceito de ecovila urbana vai muito além de sua estrutura física e da fase de implantação”, afirma.

Os moradores, relata Cabeto, pretendem que a Santa Margarida sirva de modelo para outros empreendimentos semelhantes. “E, por isso, visitas de pessoas interessadas e bem intencionadas são muito bem vindas”, afirmou.

87 mil m² nas margens do Anhumas

A área de 87 mil metros quadrados onde será implantada a Ecovila Santa Margaridafoi adquirida há três anos pelos futuros moradores que aguardam a liberação da obra por parte do poder público.

“Campinas tem uma cultura de fazer errado e depois regularizar, queremos dar o exemplo fazendo da forma correta e somos penalizados por isso. Além de que a prefeitura não tem mecanismos reais de incentivo para empreendimentos positivos como o nosso, um empreendimento extremamente impactante para a cidade é aprovado com o mesmo interesse pelo poder publico, senão mais rápido. As grandes corporações limpam o terreno, retiram todas as árvores e construções existentes, fazem grandes movimentações de terra e executam o mínimo de infraestrutura, mudam apenas a escala dependendo do publico alvo. Um projeto deste é muito mais fácil de analisar pois é padrão”, avalia o autor do projeto da Ecovila Urbana Santa Margarida, arquiteto e urbanista Flávio Januário José.

A área pertencia a Margarida Genevois, viúva do químico francês Bernard Genevois. O casal viveu ali por 22 anos, desde 1944. Ela criou ali um curso de puericultura, uma pequena creche (os berços eram feitos com caixas de cebola pintadas de azul) e fez um jornal para as mulheres, ensinando o que aprendera no curso de enfermeira de guerra. Mais tarde, em São Paulo para onde se mudou, ela presidiu a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, que acolhia opositores da ditadura militar, denunciava torturas e buscava por desaparecidos, logo no início dos anos 1970.

Hoje, além de o casarão onde o casal viveu, a piscina e uma área verde com paisagismo exuberante de dois mil metros quadrados ao redor dele é a sede social e a chamada “área comum” da ecovila, local que todos respeitam e concordaram em preservar e homenagear a história da Sra. Margarida.

COBIÇADA

Altamente cobiçada por grandes empreendedores imobiliários, já que está dentro da área urbana de uma das regiões mais valorizadas de Campinas, a proposta de compra só foi aceita depois de um trabalho detalhado do arquiteto e urbanista Flávio Januário José, autor do projeto da Ecovila.

Januário lembra que a apresentação do projeto da ecovila, com a promessa de manter intacta a área preservada por ela e por seu marido, durante décadas, foi decisiva. “Ela sempre fez trabalhos sociais com as crianças e a comunidade do bairro, e ficou feliz com a ideia do projeto e destino de sua terra”, conta. O nome do bairro e da ecovila urbana é uma homenagem a ela.

Embora o valor final pago pela compra do imóvel esteja perfeitamente dentro dos valores de mercado, o dinheiro que os atuais proprietários tiveram que desembolsar pela área e por toda a infraestrutura que será implantada está bem abaixo do preço de lotes equivalentes na região.

Muito longe do convencional

A proposta habitacional da ecovila difere totalmente das convencionais. Com base em experiências internacionais, a primeira proposta é a de incluir a diversidade. “Consideramos a diversidade cultural, a social e a econômica no empreendimento. Além das pessoas, a diversidade deve incluir também o ambiente e os outros seres vivos, de modo a construir um espaço em harmonia com aquilo que é essencial à vida”, explica o autor do projeto, arquiteto e urbanista Flávio Januário José.

Ele conta que, no início da elaboração do projeto, o grupo chegou a pensar em criar lotes mesclados com áreas pequenas e grandes, de modo a permitir a participação de famílias com renda diversificada, mas não foi possível em função da atual legislação.

“Se a lei de zoneamento permitisse tipologias de terreno e edificações variadas assim como o uso misto, e quadras abertas que permitissem a livre circulação de pessoas, a ecovila poderia ter um caráter de inclusão social muito maior, além de qualidades de iluminação e ventilação muito mais eficientes. A lei de zoneamento, como é, constitui-se em um dos maiores fatores de segregação social. São muros invisíveis”, sentencia.

Para viabilizar o projeto da Ecovila Santa Margarida dentro dos princípios da sustentabilidade, Januário propôs a criação de três ferramentas institucionais que já estão em funcionamento: a Cajueiro Administradora de Bens, que busca o equilíbrio econômico, criada em parceria com o arquiteto, urbanista e bio-construtor Edoardo Aranha; o Instituto Flor do Anhumas de BioConstrução e práticas sustentáveis, responsável pelas ações sócio ambientais e educativas, criada em parceria com a Garôa musical do também sócio e primeiro morador da Ecovila Cabeto Rocker Pascolato; e a Associação de (futuros) Moradores da Santa Margarida (AME Santa Margarida), que tem a função de realizar os consensos entre as 41 famílias que já fazem parte do projeto.

Sistemas são integrados

Na Ecovila Santa Margarida, todas as árvores da área foram registradas e catalogadas uma a uma, para que o traçado das vias causasse o menor impacto possível.

Tanto o arruamento, as calçadas e áreas de uso comum, como as construções das casas, devem respeitar no máximo a manutenção de todas as árvores. “Em alguns pontos, fizemos curvas nas ruas para evitar o corte de muitas espécies exóticas e nativas preservando jabuticabeiras, pés de lichia, castanha, copaíba, ipês e muitas outras, com mais de 50 anos de idade”, relata Januário.

O projeto de infraestrutura prevê a integração de todos os sistemas. As ruas utilizam o chamado “traficc calming”, um estreitamento da pista que se repete ao longo de todo o trajeto, de modo a forçar os automóveis a reduzirem a velocidade. No local do estreitamento, serão construídos “jardins de chuva”, que funcionam como sistemas complementares de drenagem. Os jardins são integrados com as “biovaletas” que também permitem a absorção e filtragem de água da chuva pelo solo.

As construções das casas devem ser feitas de acordo com regras de sustentabilidade, dentro das normas especificas da ABNT.