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Seminário Internacional no IAU em março de 2020

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_ de 10 a 12 de março de 2020 acontece no IAU o Seminário Internacional De Pesquisa Habitat: Resistência E Autonomia. Este seminário toma posição no contexto atual de crise sociopolítica e socioambiental, desafiando-nos a pensar como transformar radicalmente nossos modos de habitar e de produzir riquezas econômicas. Isso só será possível se rompermos com a inércia dos poderes políticos que continuam alimentando o sistema econômico neoliberal, consumidor voraz de recursos e produtor de desigualdades sociais. Atualmente, vozes e iniciativas cidadãs erguem-se no mundo para explorar outras maneiras de viver e construir um modo de vida socioambientalmente – e radicalmente – sustentável.

Segundo Arturo Escobar (2018) emergem, no Sul global, iniciativas transformadoras orientadas por referências latino americanas (como o Bem Viver, por exemplo), que busca, entre outros, uma descolonização do pensamento, em oposição com o “epistemicídio de saberes territoriais, urbanos e arquitetônicos” (FARRÉS e MATARÁN, 2014). No Norte global, reivindicações semelhantes surgem de vários debates e ações ecossocialistas, ecofeministas, de decrescimento e de convivialidade (Illich, 1973).

Assim, o Seminário Internacional de Pesquisa “Habitat: Resistência e Autonomia” reunirá a contribuição de pesquisadores da área da arquitetura e do planejamento territorial, brasileiros e franceses, que estão buscando ir além de formulações essencialmente européias e urbanas. Trata-se de enfrentar uma tarefa já enunciada por Quijano (2005), qual seja, a de liberar nossa retina histórica da visão eurocêntrica, abrindo espaço para reconhecermos especificidades do curso histórico do Sul global e dos modos de produção do espaço em contextos ‘não-urbanos’ – ou produzidos a contrapelo do urbano. Neste sentido, os pesquisadores reunidos neste evento apostam que os modos de produção espacial alternativos (autóctones, à margem dos regramentos urbanísticos, fruto de práticas tradicionais, “altermondialiste” etc) podem desempenhar importante protagonismo na constituição de outras abordagens epistemológicas para enfrentar o problema da produção do habitat a partir de lentes não hegemônicas.

Para tanto, o Seminário procurará desdobrar diferentes abordagens teóricas visando demonstrar como estes espaços se constituem como espaços de resistência e de autonomia frente à implementação de ordens hegemônicas e homogêneas, ao mesmo tempo alienadas das particularidades locais e das problemáticas globais que lhes são comuns. Tendo em vista que o posicionamento epistemológico não mantém uma relação direta com o pertencimento geográfico (SILVA et al, 2012), o objetivo deste evento, em termos práticos, é colocar em diálogo diferentes abordagens metodológicas, articulando pesquisadores brasileiros e franceses que vêm se dedicando ao assunto a partir de matrizes diversas, porém ricas em possibilidades de conexões.

PARCERIAS

Este evento dá prosseguimento à cooperação iniciada há 2 anos entre pesquisadores do Grupo de Pesquisa em Habitação e Sustentabilidade – HABIS, do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP, da Rede de Pesquisa francesa “Espace Rural & Projet Spatial (ERPS)” – uma ampla articulação entre várias Écoles d’Architecture da França. Além disso, promove também uma aproximação mais efetiva com pesquisadores da Escola de Arquitetura da UFMG e da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, alinhados com as temáticas propostas e com os quais o HABIS vem mantendo diversas formas de colaboração. Estes pesquisadores integram quatro diferentes grupos de pesquisa: Grupo de Pesquisa Morar de Outros Modos (MOM-UFMG), Laboratório Gráfico para Experimentação Arquitetônica (LAGEAR-UFMG), Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos (LabHab-USP). Além disso terá membros das unidades de pesquisa francesas AE&CC (ENSAG), Passages (ENSAPBx) e EVS-LAURE (ENSAL) e uma integrante da USINA – Centro de Trabalhos para o Ambiente Habitado, entidade de assessoria técnica de São Paulo/SP.

O Seminário culmina uma série de eventos sobre o tema da habitação rural organizados pelo HABIS. Exemplo destes são os Colóquios Habitat e Cidadania, uma série de eventos científicos de âmbito nacional que, a partir de 2011, passaram a contar com a participação do HABIS e que representa hoje um campo pioneiro de debate sobre habitação rural no país. Cabe também destacar a organização do “Io Seminário Regional do Habitat Rural”, ocorrido em março de 2019 na USP de São Carlos e que teve como objetivo debater junto a comunidade científica os resultados da pesquisa “Produção do PNHR nos assentamentos rurais do estado de SP”, financiada pelo CNPq e realizada pelo grupo HABIS entre os anos de 2014 e 2018. Os resultados desta pesquisa foram recentemente apresentados na 9ª edição do encontro da rede ERPS, realizado em outubro de 2019, em Mirabel, na França.

Portanto, este Seminário Internacional de Pesquisa Habitat: Resistência e Autonomia, apesar de seus contornos específicos, dá seguimento ao esforço do HABIS no sentido de fazer avançar os debates sobre a produção do habitat em contextos formalmente não hegemônicos.

PROGRAMAÇÃO

A programação do Seminário Internacional de Pesquisa Habitat: Autonomia e Resistência contará com mesas redondas, palestras, exposição fotográfica e plenária final. Assim, este evento constitui grande oportunidade para o aprofundamento dos debates, para troca de experiências e interlocução entre docentes, pesquisadores, graduandos e pós-graduandos de diferentes universidades e áreas do conhecimento científico, todos em torno da discussão sobre os modos de produção do espaço em contextos designados como urbanos e rurais. Em termos institucionais, o evento propiciará o intercâmbio entre universidades (brasileiras e francesas), grupos de pesquisa, organizações de assessoria técnica e instâncias dos movimentos sociais envolvidas nas práticas sócio-espaciais. Espera-se que este evento contribua para um maior aprofundamento das discussões sobre os habitats vividos pelas comunidades tradicionais e pelos grupos sócio-espaciais urbanos ou rurais.

Contribuirá, também, com a formação crítica de profissionais diversos, qualificando suas ações nestas diferentes realidades, nos diversos contextos locais.

Mesas Redondas

As mesas redondas compõem o cerne dos debates e momento privilegiado de trocas de experiências. Num total de cinco mesas, cada uma delas procura explorar, sob óticas diversas, a hipótese central do evento, qual seja, que os modos de produção espacial autônomos de comunidades tradicionais, tanto na França como no Brasil, como aqueles produzidos na disputa pela terra, tanto no campo como nas cidades, podem desempenhar importante protagonismo na constituição de outras abordagens epistemológicas para enfrentar o problema da produção do habitat a partir de lentes não-hegemônicas.

Palestras

No período da noite o evento contará com palestras que serão proferidas por lideranças de movimentos sociais que atuam em diferentes contextos brasileiros, e cuja prática cotidiana está estruturada na resistência e na luta pela terra e pelo reconhecimento de direitos constitucionais reiteradamente ignorados. O professor e liderança do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Elemar Cezimbra, apresentará uma realidade rural singular: um território camponês localizado na região centro-sul do estado do Paraná. Ele irá falar sobre como o processo de luta e resistência – articulado pelo MST desde o final da década de 1970 – transformou a região de Cantuquiriguaçu/PR num dos maiores territórios de reforma agrária do país, dinamizando a economia dos pequenos municípios da região, viabilizando a reconstrução de comunidades rurais e desenvolvendo a educação no campo. Através do relato do processo de demarcação e homologação da Terra Indígena do Pico do Jaraguá (SP), David Karaí Popygua, liderança indígena dessa região, esclarecerá os motivos pelos quais a causa indígena está intrinsecamente ligada à questão ambiental e política. De fato, a cosmovisão indígena diverge da visão nãoindígena com relação à Terra. Para os indígenas em geral e os Guarani em particular, morar num território é a condição imprescindível para desenvolver um habitat que possa permitir o Nhandereko, o modo de ser Guarani, que permite manter uma relação privilegiada com a natureza e o não-humano. Assim, em sua fala, David irá expor os conflitos gerados por paradigmas de vida fundamentalmente heterogêneos e as estratégias de resistência que sua comunidade implementa há décadas na luta por seus direitos.

Exposição fotográfica

Lançando mão de linguagens visuais e buscando enriquecer e alimentar os debates travados ao longo das mesas redondas e palestras, este Seminário contará com uma exposição fotográfica de Hélio Passos Rezende, denominada “Episódios da interculturalidade dos Kyikatêjê: uma abordagem pós-histórica”. Os indígenas Kyikatêjê são uma das três etnias que vivem na Reserva Indígena Mãe Maria (RIMM), no município de Bom Jesus do Tocantins, no sudeste do estado do Pará. A resistência sócio-espacial dos Kyikatêjê está relacionada ao conceito de interculturalidade que segundo eles trata da sobrevivência de suas tradições culturais e ao mesmo tempo de sua sobrevivência como parte da cultura dos Kupês (os não indígenas). Hélio Passos Rezende trabalha com “episódios” desta interculturalidade, por meio do que Vilém Flusser chama de “estruturas” numa lógica pós-histórica. Por meio de um ensaio fotográfico acompanhado de narrativas que compõem os episódios, são capturados gestos das práticas cotidianas, da preparação para os rituais e os próprios rituais, revelando as formas de resistência das tradições na pintura corporal, na escola, na pescaria, na brincadeira do arco e flecha, na corrida de tora e no futebol.

cartaz e programação completa – anexo